É comum ouvirmos a frase “A endodontia é uma das áreas da Odontologia menos reconhecida pelos pacientes”. Tal fato não está associado a pouca importância que alguns possam atribuí-la e sim à inobservância que a maioria dos profissionais insistem em dar ao momento mais importante do tratamento, o diagnóstico.
Não é raro sermos questionados, mediante uma radiografia enviada via e-mail ou WhatsApp, se devemos ou não tratar endodonticamente um dente. Um convite tentador para realizarmos o diagnóstico de uma suposta patologia considerando apenas o exame por imagem. De fato, a presença de uma lesão periapical é um sinal clássico da necessidade do tratamento endodôntico, entretanto, é preciso compreender os fatores etiológicos, o estado geral de saúde do paciente, as circunstâncias, os sinais e os sintomas associados. Somente a partir de um exame clínico completo poderemos atestar a existência da doença com a indicação precisa do tratamento.
Realizar o diagnóstico é trilhar o caminho desde a observação do modo com que o paciente vem ao nosso encontro até a realização dos mais complexos exames complementares, quando necessários. O diagnóstico é absolutamente técnico, um passo a passo descrito em qualquer livro de endodontia, uma sequência clínica cujo objetivo é identificar a anormalidade. Não é necessário nenhum talento inato, o profissional precisa sim ter o conhecimento da técnica, da histofisiologia e das patologias que podem acometer a área examinada.
A técnica do diagnóstico obedece uma sequência sistemática de três passos:
PASSO 1 – Semiogênese, etapa na qual o examinador busca, através de um questionário, informações acerca da doença e da condição sistêmica do paciente;
PASSO 2 – Semiotécnica, etapa do exame clínico, com a realização de testes fundamentais de inspeção, palpação, percussões vertical e horizontal, sensibilidade pulpar a frio, e se necessário testes de sensibilidade pulpar a quente ou de cavidade. Ainda, execução de exames por imagens e laboratoriais. A partir de então, busca-se tabular sinais e sintomas da doença;
PASSO 3 – Propedêutica, momento de se interpretar as informações obtidas nas etapas anteriores, a fim de se elaborar uma hipótese de diagnóstico.
Diagnosticar é uma arte e um momento único em que podemos agregar valor ao tratamento endodôntico, mostrarmos que somos os detentores do conhecimento, que temos a compreensão do todo, na certeza do adequado plano de tratamento. Seja a partir da semiogênese, semiotécnica e propedêutica, é neste momento que remontamos toda a história da doença, do início até o momento atual e chancelamos a necessidade ou não da intervenção endodôntica. Diagnosticar é se conectar com o paciente, ser solidário às dores, às angústias e necessidades. Alcançar este objetivo requer a habilidade de saber ouvir. De nada vale uma boa pergunta se a resposta não é registrada e interpretada. Dizer apenas “você precisa fazer um canal” é reduzir toda a ciência endodôntica a um simples ato de “limpar um buraco”, e fatalmente condená-la a um eterno papel secundário no tratamento reabilitador.
Cabe a todos aceitar o desafio de mudar essa realidade. Para tanto, devemos buscar conhecimento, dominar e aplicar as técnicas de diagnóstico, investir em equipamentos e principalmente desenvolvermos o espírito investigativo, persistente e inquieto do bom examinador. Dessa forma, a Endodontia abandona o fundo do palco e contracena com as demais especialidades sob os holofotes do sucesso.
É fundamental a cobrança dos honorários referentes à consulta para o estabelecimento do diagnóstico e planejamento do tratamento endodôntico. É neste momento que mostramos toda a nossa capacidade, conhecimento e vivência clínica. Tais competências custaram caro ao profissional, desde a graduação até todos os cursos e horas de estudo. Para tanto, é importante ser metódico, disponível e principalmente respeitoso com a história da doença. A consulta inicial já é parte do tratamento.